Zhang Yimou

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segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Marcas do Passado (crítica e download)


Eu devo ser muito louca mesmo ou enxergar coisas que ninguém consegue ver. Essa é a minha única resposta para quando eu gosto tanto de um filme que ninguém mais aprova! Exemplo é Marcas do Passado (Aloft, França/Espanha/Peru, 2014) de Claudia Llosa.

Este é o primeiro filme da diretora peruana fora de seu país, de sua língua materna e de elenco conterrâneo. Llosa leva a narrativa para o Canadá, contando a história de Ivan (Cillian Murphy), homem na casa dos trinta anos que inicia uma busca pela sua misteriosa mãe Nana Kunning (Jennifer Connelly) que não vê há vinte anos.

O filme se divide em dois ramos temporais. Inicialmente temos a personagem de Connelly com seus dois filhos pequenos, sendo o mais novo Gully com problemas sérios de saúde. Para que o foco não seja no menino moribundo, seu rosto é omitido em todos os momentos. A mãe procura com desespero a um curandeiro a busca pela cura do menino, e nesse ambiente acaba por descobrir que quem tem o “dom” da cura é ela própria.


É fato que o roteiro não é totalmente explicativo, entretanto isso não é ruim. Nem tudo tem que ser corretamente dito em um filme para que possamos entender. Em Marcas do Passado tudo está muito bem implícito, principalmente porque a foco da diretora claramente não era a busca por questionamentos sobre a veracidade desse tipo de espiritualidade e esoterismo, e sim evidenciar a relação mãe-e-filho.

Ivan é apresentado como um garoto petulante e insolente. A paixão pela falcoaria nos mostra não só a única ligação que ele tinha com o pai, mas como existe a preferência em se afastar das pessoas. O ciúme pelo irmão mais novo Gully é nítido e incômodo. Existe no personagem uma ansiedade, uma vontade muito patológica em machucar e desprezar a mãe, tudo gerado pelo ciúme que sente por Gully, doente atrai maior atenção por parte de todos.

Após apresentação inicial dos personagens e do drama, temos Melanie Laurent que faz a transição temporal para vinte anos no futuro, e encontramos Ivan adulto, mas introspectivo da mesma forma. Interpretando a jornalista Jannia, Melanie o leva na busca ao interior do mundo pela mãe que há muito tempo saiu da vida de Ivan. Os motivos para o abandono são totalmente compreensíveis diante da dor, mas não para Ivan.


Como eu disse, o roteiro cumpre com o papel que Claudia Llosa queria construir no filme. É obvio que sua intensão não era que tudo viesse mastigado ao espectador, nós teríamos que digerir e entender a narrativa a partir das relações emocionais que acontecem. E isso é muitíssimo bem feito.

A sintonia de Jennifer Connelly com as crianças é o ponto chave do filme. Eu já comentei em minhas críticas como eu gosto da premiada atriz. É simplesmente impossível não se encantar e emocionar com seu trabalho. Existe uma delicadeza e serenidade que ela emprega nos seus personagens, que aqui foi crucial. Essa característica marcante de Connelly foi o principal para a cena do desfecho do drama, que particularmente me emocionou muitíssimo.

É claro que temos Cillian Murphy, um ator excelente que conseguiu na cena mais importante do filme se mostrar firme na magoa e culpa do personagem Ivan. Havia uma química muito bem construída com Melanie Laurent, como ocorreu no seguimento incrível (e que completa a narrativa temporal do passado) da caminhada no gelo.   

Apesar do que disseram sobre o final do filme, realmente não consigo entender o porquê da incompreensão. Ao contrário do que nos era mostrado, era Ivan que necessitava da cura, pois não era o físico que estava doente, mas a sua alma e sentimento. A última cena do voo do falcão é uma analogia muito obvia da libertação, da liberdade que ele precisava e só conseguiu achar ao enfrentar seu passado.


Como se trata de um filme de arte, a necessidade insistente do mercado de entretenimento de filmes extremamente dinâmicos e que se adequam a nossa mente doente das informações rápidas e automáticas, não existe aqui. Claudia Llosa não se importa com essa imposição, e se dedica em explorar com calma cada personagem.

A trilha sonora é quase inexiste, a exceção da ótima Le Vent Nous Portera de Noir Désir, com sua letra tão pertinentemente na narrativa: “O vento vai cuidar de nós/ O cuidado e o desprezo/ E essa ferida que nos mantém divididos (...) Eu sigo sua sombra/ Pedaços de você/ O vento levará/ Tudo vai sumir, mas/ O vento nos guiará”. Além disso, temos uma fotografia muito acinzentada e paisagens belíssimas do interior do Canadá e do Ártico.  Um último comentário é a respeito da maquiagem, que deu realismo notável no envelhecimento da personagem de Connelly.


Lançado em Berlinale e também no Festival do Rio deste ano, Marcas do Passado é um filme sobre sentimento que vai muito além das palavras. É sobre fé e dor, e a relação difícil e as consequências que se cria quando essas duas coisas se unem.



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Abraços!



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