Quem é o autor?
Um pouco sobre adaptações cinematográficas.
Um pouco sobre adaptações cinematográficas.
por Cybele Nascimento
Sou uma assídua espectadora de Game of Thrones e já
li todos os livros lançados sobre a saga As Crônicas de Gelo e Fogo de George R.
Martin. Muitas noticias surgiram essa semana da ação dos produtores se
defendendo da confusão que surgiu diante do trágico penúltimo episodio da
quinta temporada da série. Os produtores jogaram toda a culpa no próprio
autor dos livros de qual a serie é derivada, mas nada justifica tamanho mau gosto
para prosseguir com a narrativa televisiva.
Não vou discutir aqui o fato que os produtores estão fazendo sofrer somente personagens mulheres ou crianças mulheres, em uma crise misógina ainda não explicada. Como é uma série
financeiramente rentável, não existem muitas discussões para solucionar o
problema da distorção da adaptação. E o publico que eles mais querem agradar é o americano, que no caso ama assistir violência. Quero comentar exatamente o que me fez
pensar com essa situação.
Sempre fui uma pessoa que sigo o
pensamento de que “livro é livro, filme é filme”, e podemos enquadrar séries e
etc. A partir do momento em que um diretor se apropria de uma estória da literatura
para adapta-la cinematograficamente, o livro não pode ser utilizado como parâmetro
ou justificativa para nada. Eu acredito no principio dessa ideia, por crer que
uma obra do cinema e um livro são dois suportes completamente distintos e que
ambos possuem suas complexidades que deve ser resolvidas somente nesse meio. Mas até onde vai o direito de preservar “uma
ideia”? E por que simplesmente o cinema foi invadido por uma fase de
adaptações?
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"Lugares Escuros", estreia na semana que vem. Autor: Gilles Paquet-Brenner ou Gillian Flynn? |
A modernidade colocou a situação
em um nível difícil: o acesso aos livros não limita somente as livrarias, mas em
qualquer Ipod, celular e qualquer outro aparelho eletrônico que tenha conexão com
a internet. As pessoas continuam lendo
(e a qualidade do que estão lendo é discutível), principalmente best-seller, que são as maiores fontes de adaptações para o cinema. É ótimo que as pessoas estejam tendo a experiência
que só uma boa leitura pode ter, mas dificulta e trás uma perda enorme ao
cinema, pelo simples motivo: o mistério está se perdendo.
Todos vão ao cinema com toda a
carga da própria imaginação após ler determinado livro, e não conseguem mais realmente
apreciar e desvendar os personagens, os cenários e o ambiente que um filme tem
que construir. Saem da sala com revolta porque o personagem está loiro, quando
era moreno na literatura, etc. E no final, temos uma chuva de criticas, SEM
NUNCA AVALIAR PELO PONTO DE VISTA CINEMATOGRÁFICO. Sem falar que todos já sabem
o final.
Não é predileção minha por parte
do cinema (embora seja a minha manifestação artística), e de maneira nenhuma quero que parem de ler. Mas às vezes sinto como se
estivesse existindo um lapso criativo nos diretores, e não podem mais ter realmente
boas ideias, e se sujeitam somente ao mercado cinematográfico. O poder de
criação deles ao fazer uma adaptação (se financiada por algum estúdio é zero)
está completamente limitado. Tudo já está bem explicito nos livros, que hoje em
dia é escrito pensando exatamente nisto. Desde que o cinema foi criado existe adaptações, mas porque os diretores não se apropriam da "ideia" para criar uma outra visão? Uma visão pessoal? Um exemplo primoroso é Kubrick, que adaptou O Iluminado, de Stephen King, ao ponto do escritor dizer "o filme não foi baseado no meu livro!". São obras completamente distintas, o diretor se apropriou da ideia do escritor e transformou em um dos melhor clássicos do cinema. Isso é adaptação, isso é criação.
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"Cidades de Papel", do novo queridinho do pedaço John Green. Veja como no poster nem o nome do diretor aparece. |
O trabalho do diretor hoje se resume em criar filmes que “respeitem as expectativas dos fãs”. Como chegamos a isso? O cinema é uma manifestação artística que deve partir do talento do diretor, se um escritor de um livro é chamado autor, o mesmo dizemos do diretor. E como foi que do nada, passou a ser apenas o adaptador? Estou farta do “baseado em”, “do Best seller de”, e cada vez o diretor se tornar invisível. E ai, quem é o autor?
O fato de existir uma categoria no autointitulado “maior prêmio do cinema” Oscar, de melhor roteiro adaptado já diz isso. Esta categoria está mais concorrida do que o próprio melhor filme. Me deprime que o público do Brasil esteja cada vez mais absorvido pelo cinema americano, e que não consiga se abrir para o cinema Europeu ou o Oriental (que ainda não foi invadido por essa fase de falta de criatividade).
O fato de existir uma categoria no autointitulado “maior prêmio do cinema” Oscar, de melhor roteiro adaptado já diz isso. Esta categoria está mais concorrida do que o próprio melhor filme. Me deprime que o público do Brasil esteja cada vez mais absorvido pelo cinema americano, e que não consiga se abrir para o cinema Europeu ou o Oriental (que ainda não foi invadido por essa fase de falta de criatividade).
A ideia de Bazin do personalismo
e a teoria de um cinema autoral pensada por Truffaut, nunca fez tanto sentido
no cinema hoje.

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