A segunda parte da trilogia de
Wes Ball, Maze Runner: Prova de Fogo (Maze
Runner: The Scorchs Trials, 2015, EUA), chegou aos cinemas no ultimo dia 17
de setembro. Em uma investida ridícula de angariar lucro, o estúdio lançou em formato
3D, e o clássico 2D. A desnecessidade da terceira dimensão é obvia, sendo um
bom entretenimento na nossa normal e adequada segunda dimensão. Desde que
assisti Maze Runner: Correr ou Morrer (The Maze Runner, 2014, EUA) tive vontade de
escrever esse comentário critico, mas como já estava próximo da estreia da
sequência prefiro emendar os dois em um mesmo texto.
Os filmes são adaptações dos
livros de James Dashner, lançado a partir de 2009. Talvez esse seja um ótimo
exemplo do que realmente se trata uma adaptação cinematográfica. Adoro
distopias, e li os dois primeiros livros, embora seja totalmente desnecessário
para entender a narrativa fílmica. Ou seja, voltamos ao fato básico: filme é
filme, livro é livro. São distintos, e isso não é ruim.
Apesar de ser de grande estúdio,
Hollywood a toda a prova, Wes Ball construiu sua própria trilogia. É obra de
Ball, não de Dashner. As pessoas precisam começar a entrar em uma sala de
cinema e se permitir admirar uma nova visão de uma ideia. Isso é cinema.
Correr ou Morrer, 2014 |
Em Correr ou Morrer somos
introduzidos na narrativa protagonizada por Thomas (Dylan O’Brien), que acorda
assustado e desmemoriado em uma gaiola de metal. Após esse momento de choque
(para o personagem e o espectador, claro), ele de repente se vê em um grande
campo, preso no centro de um labirinto de pedra, junto com mais algumas dezenas
de rapazes. Ninguém se lembra, ninguém
sabe como chegaram ate lá.
Embora se torne mais evidente no
livro à dinâmica social que se forma, o roteiro de Ball foi bastante fiel a
mostrar como que uma sociedade se organiza e sobrevive em um ambiente hostil.
Ao contrario do que muitos pensam, em determinadas circunstâncias o ser humano
instintivamente se adéqua a essas situações. E muitas referências filosóficas e
antropológicas são retratadas aqui (não sei dizer se acidentalmente ou
propositalmente), como a teoria da caverna de Platão e a formação de Estado.
Esse tema foi profundamente tratado em O Senhor das Moscas, de William Golding
(incluindo uma adaptação cinematográfica em 1990). E claro, que Maze Runner é
superficial ao abordar essa filosofia, mas evidências então por lá.
Após o estranhamento de serem
colocados na “clareira”, saem do estado de natureza, e admitem-se
submeter a uma força superior. Os garotos do labirinto criaram por si mesmo um
Estado, erguendo como liderança um dos rapazes, além de se estabelecerem três
regras básicas de sobrevivência. Todos possuem um trabalho especifico, e são
cabíveis de punição caso descumpram as regras. Ate mesmo o próprio vocabulário
foi criado, com palavras como “mértila” (derivação de merda) e “trolho”
(idiota, babaca etc), ou seja, um sistema completamente consolidado e
funcional, que não os permitia questionamentos... Até a chegada de Thomas.
Correr ou Morrer, 2014 |
Nessa questão Thomas, viria ser o
elemento principal de desordem, e quebra do sistema. E para que tudo se
complique ainda mais, surge mais um elemento essencial e que opera complicações
no já frágil sistema, uma garota chamada Teresa (Kaya Scodelario) chega ao
labirinto, exclamando a plenos pulmões o nome de Thomas. E nessa parte surgem
em contraponto um personagem interessante, o Gally (Will Poulter). Este viria
ser toda a representação e prática da ideia da caverna de Platão. O temor e o desespero do desconhecido, do
virar as costas para a realidade e não acreditar nos questionamentos que todos
passam a ter quando Thomas começa a desbravar os mistérios do labirinto. A
clareira é a caverna de Gally, e parte para a violência e força bruta para que
este sistema já destruído consiga se firmar.
São várias conclusões que podemos
tirar do filme, e não quero equiparar a qualidade da ideia com a de O Senhor
das Moscas, mas são duas fontes necessárias e que poderiam ser muito bem
exploradas em uma sala de aula por exemplo. Minhas aulas de filosofia e
sociologia sempre foram um tédio, com textos enormes e que não eram muito
explicados pelos professores. A minha sorte é que eu tenho uma irmã antropóloga
e socióloga, ou seja, aprendi a ver de outra maneira aquela chata disciplina. E
quando assisti ao filme, pensei, poxa por que não usar isso como forma de
aprendizado? Vivemos na era da informatização e modernidade, as informação são
dadas a uma rapidez absurda, a cabeça de uma criança ou adolescente já nem é
igual a minha na idade (e sou bem jovem, 22 anos!!). Precisamos buscar formas
de captar a atenção desses jovens e instruí-los de maneira correta, e acredito
que o uso de um filme novo, com elenco jovem e conhecido, possa ser muito bem
explorado. Eu amo cinema, e nunca neguei a ideia de como ele pode ser útil em
várias funções.
Prova de Fogo, 2015 |
Além de tudo isso, temos um filme
muito bom em entretenimento e em produção. Houve trabalho na construção dos
personagens, com um elenco juvenil muito bem escolhido. Dylan O’Brien encarnou
bem o assustado e atormentado Thomas, assim também estava Will Poulter como o
desacreditado Gally. Temos ainda Thomas Brodie-Sangster (envelhecer nunca!)
como o leal Newt, o coreano lindíssimo Ki Hong Lee como o forte e firme Minho.
E as únicas mulheres do elenco, encabeçadas por Kaya Scodelario vivendo a
enigmática Teresa e Patricia Clarkson como a Dr. Ava Paige. A fotografia
é bem colorida e com porções de ocre, uma alusão a universo perdido e desolado.
A trilha sonora de John Paesano (que voltaria a trabalhar no próximo filme)
completa o filme. A música acompanha com sutileza os momentos de correria que
tanto nos agita durante a narrativa.
A sequência Prova de Fogo
certamente elevou-se em caráter de qualidade de produção. Se no filme anterior,
havia certas complicações no quesito técnico (os efeitos visuais na construção
do labirinto não eram os melhores), neste o problema foi resolvido. Embora
muito fosse discutido sobre as modificações radicais do roteiro, é obvio a
tentativa de Ball se desfazer de uma possível alusão a Jogos Vorazes. Digo isso
pela maneira como o livro trata de colocar os jovens novamente em uma luta de
sobrevivência, como um jogo de todos contra todos. Por isso, as modificações no
roteiro vieram em beneficio, pois a comparação seria inevitável caso se
seguisse a risca a narrativa literária.
Entretanto, houve a introdução de
personagens extremamente inúteis (e que nem no livro existiam) e que não
trouxeram nenhum tipo de resolução para o assunto, como é o caso da personagem
Dr. Mary Cooper, de Lili Taylor. Com algumas porções de falas, a personagem
entra e sai do filme sem fazer a menor diferença. Outros personagens foram
essenciais e muito bem explorados, como Jason (Aidan Gillen), Brenda (Rosa
Salazar) e Jorge (Giancarlo Esposito). Talvez o motivo de existir tantos
personagens, a narrativa se estendeu um pouco, mas não o suficiente para
irritar o espectador.
Prova de Fogo, 2015. |
O último ponto a comentar,
extremamente positivo, é a maquiagem de Prova de Fogo. A caracterização dos
ditos “Cranks” era uma mistura bem resolvida de Walking Deads e Eu Sou a Lenda.
Aterrorizantes por sinal, as cenas de perseguição no subsolo são angustiantes,
e com direito a pulos de susto e aquela agitação que o filme trás. Prepare-se para ficar exausto assim como os atores, a correria é tanta que deve ter emagrecido uns três quilos assistindo ao filme!
Maze Runner terá sua finalização
em 2017 com A Cura Mortal. Mostrando firmeza em não ceder ao lucro, Ball
afirmou que a adaptação não seria dividia em dois. As filmagens começam ano que
vem, e assim aguardaremos o desfecho de mais uma distopia, e como uma amante de
cinema sempre vejo o lado positivo desses enormes clichês.
P.S: Pra mim CRUEL é bom!
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Correr ou Morrer:
Prova de Fogo
Disponível no Telecine Play.
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