Todos os filmes de Radu Mihaileanu são caracterizados como
“comédia/drama”, um dos únicos diretores que conseguem de forma perfeita
englobar dois estilos cinematográficos que geralmente são distintos. A Fonte das Mulheres (La Source des Femmes, França/Itália/Bélgica,
2011) era o único filme do diretor romeno que ainda não tinha visto.
Utilizando mais uma vez a
religião como combustível principal da trama, Radu cria uma narrativa sobre a cultura
árabe e o islã. Seus filmes anteriores trouxeram o judiamos (visto que o
diretor é judeu) como protagonista, em A Fonte das Mulheres o islã é colocado
em discussão com as oportunidades e direitos das mulheres.
Em um vilarejo no meio das
montanhas provavelmente entre o Norte da África e o Oriente Médio, a seca
assola a região a mais de 10 anos. Com isso, a única oportunidade de pegar agua
está em uma fonte que fica no alto da montanha, e uma subida sinuosa e
perigosa. As mulheres que são as responsáveis de ir buscar a água, entretanto
diante dos vários abortos que as mesmas passam a ter diante da subida perigosa,
elas resolvem se revoltar contra o machismo dos homens da aldeia, e exigem que
eles as ajudem. Para isso elas utilizam a estratégia de greve de sexo.
A cena inicial é bastante elaborada
e que define claramente o que seria a vida diária daquelas mulheres. Ao mesmo
tempo que uma mulher está dando a luz, outra está perdendo a criança. E nessa
mesma cena, o diretor inclui o elemento principal da vida e o que seria o
causador de todo o conflito da narrativa, a água. A mulher desce a montanha com
a água, a água que que limpa o suor e a criança que acaba de nascer. Um dos
melhores prólogos que já vi em um filme, com certeza.
A Fonte das Mulheres é um dos
poucos filmes feitos por estrangeiros que conseguem de forma bastante
convincente e respeitosa mostrar como realmente se constitui uma determina
cultura. É obvio que existe o extremismo em vários lugares e em vários níveis,
entretanto este não é a maioria. Radu se preocupa em mostrar que o machismo e
sexismo é algo que é perpetuado por base da distorção da teoria religiosa que
se segue. Isto é visto claramente no seguimento tão interessante da conversa
das mulheres com o líder religioso da aldeia, onde se discutem com uma
interpretação coerente do Alcorão. Inclusive é o imã que se mostra o mais
coerente dos homens e o mais propenso a ouvi-las, pois é ele que mais conhece a
religião e as palavras do profeta Maomé. Como sempre ocorreu em todas as
religiões, tudo é distorcido para agradar algum setor da sociedade, e no caso
da narrativa é mais fácil, visto a quantidade de pessoas analfabetas, homens ou
mulheres.
Sem dúvida, o filme é uma ode ao empoderamento
feminino e como a união pode significar a vitória na luta por direitos. As
mulheres não desrespeitam a sua própria fé, e nem aos seus homens. Elas buscam
o simples fato de querer existir e ser dona de suas próprias escolhas.
Radicado na França a muitos anos,
o diretor trouxe um elenco de maioria francês, mas com ascendência árabe, com Leïla Bekhti, Hafsia Herzi, Biyouna, Saleh
Bakri, Sabrina Ouazani e Hiam Abbass. Com uma clara preocupação em
contextualizar a narrativa e a torna mais real possível, Radu coloca o elenco
falando em árabe, e toda a ambientação é feita, com o figurino e cenários bastante
honestos com a realidade. Além disso, ele inclui o musical de forma sensível e
delicada. Momentos de conflito entre os personagens são complementados com
canções (poucas) entoadas ao estilo cultural que o filme se propõe a mostrar.
Se antes Radu Mihaileanu me
encantou com a incrível história do judeu da Etiópia em Um Herói do Nosso Tempo (Va,
Vis et Deviens, Israel/França, 2005) e a comedia dramática tão
criativa de Trem da Vida (Train de Vie, França/Israel,
1998), sem falar do belíssimo O Concerto
(Le Concert, França, 2009)
com Melanie Laurent. Recomendo
todos!
Abraços!
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Não dá sem via torrent
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