Eu fico sempre com uma raiva
quando perco meu tempo vendo filmes ruins! Nesses últimos dias resolvi ver dois
dos filmes indicados ao Oscar, no caso Joy – O Nome do Sucesso (Joy, EUA, 2015)
e Cinco Graças (Mustang, Turquia/França/Alemanha, 2015). Depois de perder duas
horas da minha vida assistindo e depois mais um dia com ódio de uma produção
tão medíocre do senhor David O. Russell, embarquei para minha segunda escolha,
que no caso é o muito bom Cinco Graças.
Diante do avanço das redes terroristas,
principalmente a do Estado Islâmico, o ocidente começou a ver com outros olhos o islamismo, e com um preconceito
generalizado. Os países do oriente médio e Ásia que possuem o islã como doutrina
de fé majoritária não são iguais. É a mesma religião, mas são raças diferentes:
existem os árabes, os turcos, os curdos, os persas. Ou seja, culturas que
possuem semelhanças, mas não são iguais. Começo assim para poder contextualizar
o filme em questão, Cinco Graças que tem uma narrativa localizada na Turquia.
A Turquia é o antigo Império Otomano, que assumiu o Islã desde 1500.
São séculos de cultura modificada e que se misturou com a cultura árabe,
tornando o que é hoje. É um país extremamente moderno – Istambul é dividida ao meio, metade é asiática e a outra europeia -
assim como o Brasil. Eu já viajei até
lá, e muita coisa que eu imaginava que era alimentada pela mídia, foi vencida.
Essa ideia surge porque nós ocidentais simplesmente não conseguem entender como
a Turquia conseguiu conciliar a tradição e cultura islâmica com a modernidade e
a avalanche da ocidentalização. Estamos acostumados a ver um muçulmano ortodoxo
como o único parâmetro, e o liberalismo é de difícil assimilação para os
ocidentais. O fato básico é, usar um véu ou ter uma barba grande não tem faz um
muçulmano. É uma questão muito
abrangente. Uma mulher que não cortou seus cabelos e não usa uma peruca ou
turbante, não é menos judia do que a usa.
Entendendo assim, podemos falar
de Cinco Graças, filme produzido pela França, Alemanha e Turquia, da diretora
turca com nacionalidade francesa Deniz
Gamze Ergüven. Ela constrói uma narrativa com nítidas influencias e
citações ao As Virgens Suicidadas (The Virgin Suicides, EUA, 1999) de Sofia Coppola, entretanto sua ênfase é
na discordância com a tradição e o ambiente em que as protagonistas estão
submetidas. Particularmente (eu Bellyta!) não me agrada o estilo de Sofia Coppola,
por diversas razões que não vou explicar aqui, por isso vou me concentrar no
filme, com a questão cultural que ele aborda.
Transferindo a narrativa para o
interior, Deniz Ergüven indica cinco irmãs órfãs, com idades de 12 a 16 anos
que são criadas por sua avó. Elas sempre foram criadas com liberdade, em um
meio disfarçadamente liberal. Após um incidente, extremamente banal, elas
passaram a ser confinadas em sua casa, em uma busca por parte da família em
parar a rebeldia descabida delas.
Embora seja um texto muito bem
escrito, o filme peca um pouco na excessiva sequência de ação e reação que
acompanha todo o filme. Elas fogem,
colocam grades na janela, pulam o muro, colocam pregos do muro, esse tipo de
coisa que poderia ter sido dispensado.
Com a narração in off da caçula
das irmãs, Lale – interpretada brilhantemente
pela atriz Günes Sensoy, que recentemente
viveu a personagem de Beren Saat na versão infantil de Kösem Sultan, do
spin-off de The Magnificent Century (Muhtesem Yüzyil) – ela é uma criança
madura e forte, e que com indignação percebe cada uma das suas irmãs mais
velhas sendo levadas para o casamento. Sonay
(Ilayda Akdogan ) e Selma (Tugba
Sunguroglu) são as primeiras a ter seu casamento arranjado – em uma cena
bastante crítica, ao mostrar com o arranjo é superficial, as noivas são escolhidas
a esmo – apesar que a primeira teve sorte, com impetuosidade e altivez
conseguiu impor sua vontade. O mesmo não aconteceu com Selma, que se viu em
situações constrangedoras, e que para nós ocidentais é retrogrado. E na
sequência da linha de casamento Ece (Elit
Iscan).
Acho interessante pensar que o
que levou a essa prisão e ao resgate dos valores tradicionais não foi o
incidente ocorrido, e sim uma desesperada afirmação social e medo da opinião
pública. Se o meio do qual são criadas fosse conservador e rígido, não
existiria a postura comportamental liberal que as personagens são
representadas. Deniz Ergüven dialoga mais é com a imposição social que levou a família
em aprisionar as jovens.
No decorrer do filme percebermos
ainda que nem tudo é o que parece. Surge a hipocrisia e ironia em expor como
maior pecado um problema externo, quando sérios conflitos acontecem dentro do
lar. Esses conflitos levam a um clímax terrível, mas que nos indica o poder da
repressão em um ser humano.
Apesar de se mostrar uma
sociedade extremante patriarcal e machista – a pobre Lale não pode assistir aos
jogos de futebol, precisa estar sentada com as mulheres vendo novela – a diretora
não permite que todos os homens da narrativa sejam condenáveis. Ela coloca
homens bons, e jovens, como o caso do personagem Yasin (Burak Yigit), que é o que salva as meninas no final.
O mais interessante, é que a
diretora constrói uma narrativa que não se prende a barreiras geográficas, essa
história poderia ser narrada no contexto de uma cidade do interior do Brasil. O
fato que levou aos acontecimentos não foi a religião islâmica, mas a tradição
conservadora, que por ventura temos no nosso país. Sinceramente, as personagens
eram muito mais desenvolvidas sexualmente do que eu na idade delas (cresci em
um lar católico, mas bastante livre, e na cidade grande), ou seja, a Turquia
não é diferente que o Brasil cristão.
Cinco Graças consegue em seu
texto conciliar o humor com o absurdo, perfeitamente. A trilha sonora acompanha
todas essas etapas com suavidade, e exatidão. Uma bela fotografia, e uma edição
bem dinâmica. O elenco conseguiu uma sintonia e conexão excelente, pois a proximidade entre as irmãs era necessária, e foi sensível. Sua indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro veio por parte
da França, e é bem merecida.
Abraços!
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seu site é muito cotinue assim.
ResponderExcluirEspero que a continuação do "muito.." seja bom, ok? hahah Enfim, volte sempre!
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