O jovem grande artista chamado
Xavier Dolan é realmente encantador. O primeiro filme que vi dele foi Mommy (Mommy, Canadá, 2014)- que você pode ler
a crítica aqui - e depois daquela explosão de sentimentos busquei ver todos os
outros dirigidos por ele.
Tom na Fazenda (Tom à la Ferme, Canadá, 2013) foi
produzido antes do sucesso e bem recebido Mommy, e na prática se torna um filme
com técnica totalmente diferente dos trabalhos de Dolan. O filme ganhador do FIPRESCI
em Veneza 2013, trás para as telas uma temática de suspense e drama psicológico
extremamente bem construído em um enredo angustiante.
Protagonizado pelo próprio Xavier,
o filme narra um episodio da vida de Tom, um rapaz que após a morte de seu
parceiro, visita à casa da família do falecido. Entretanto a mãe do seu
companheiro não sabia da existência dele ou da relação que os dois mantinham. Assim, ele embarca em uma crise familiar,
sendo obrigado por Francis (Pierre-Yves Cardinal), o irmão mais velho, a participar desse drama.
Como é comum nos filmes de Dolan,
não sabemos exatamente nada a respeito dos personagens. É nítido como ele gosta
de tratar de momentos exclusivos da vida dos personagens, sem responder as
perguntas que nos vem à cabeça: como eles se conheceram? Como foi que Guillame
morreu? Quem é essa pessoa Francis?
Essas respostas não são pertinentes para Dolan
no desenrolar da trama, ele deixa que o espectador tire as conclusões que
quiserem. O que importa é os sentimentos que são aflorados durante o
desenvolver do filme. Tom está dominado pela dor e o luto. Sua viagem ate a
casa do falecido parceiro era uma busca desesperada em encontrar alento e
companhia para enfrentar tal sofrimento. Mas além de não achar o que procura,
encontra uma situação doentia e a verdade de entender que não conhecia a pessoa
com quem vivia e amava há anos.
É interessante como a linguagem cinematográfica
consegue transmitir a energia e a tensão do ambiente em que a história irá
surgir. Desde o inicio Dolan trata do cenário o mais fúnebre possível. Um ambiente
como uma fazenda é algo fértil e vivo, mas aqui é seco e morto. A sensação é de
inospitalidade, e de frieza, o que também se reflete pelo olhar de Tom, que
está de luto. Sabemos que algo está errado também pela construção da casa – o quarto
de Francis é pequeno e claustrofóbico, a janela é minúscula e as persianas de
faixas verticais, é a metamorfose do ambiente em uma prisão. A mãe de Guillame,
Agathe (Lise Roy) se torna um espectro dentro do ambiente, em uma mistura perturbadora
de alguém que sabe da realidade e a força que mantém em acreditar no que dizem
a ela. Ela passa a dedicar a Tom se este fosse seu filho, visto que o rapaz
desconhecido era o único elemento vivo do falecido filho. E então temos
Francis.
Assim como em Mommy, onde Xavier
Dolan cria o personagem Kyla (por Suzanne Clément), que não sabemos nada sobre
sua história, e é um personagem enigmático e essencial na trama, temos Francis
de Tom na Fazenda. O irmão mais velho
não permite que saibamos qual sua personalidade e qual serão seus próximos passos.
A simples presença dele é o ponto de partida para a tensão se iniciar, seja com
a câmera turvada ou com a trilha sonora que se torna perturbadora. Tom se vê atraído
por este homem, mas isso se dá por sua fragilidade neste momento tão difícil. E
da mesma forma que se inicia, termina o filme sem que nenhuma conclusão
realmente concreta se possa ter de Francis. Nem mesmo Tom consegue chegar a
isso.
Realmente Xavier Dolan trás uma
bagagem pessoal muito sentimental em seus filmes. Em certos enquadramentos da
casa, principalmente na relação de visão da sala-cozinha, se assemelhava os
enquadramentos encontrados em Mommy do mesmo ponto de vista. Além de mais uma
vez ele expor as personagens femininas com roupas tão “bregas” e extravagantes.
Aqui quem parte nesse cenário é Sarah, personagem conclusiva da trama, vivida
por Evelyne Brochu.
A trilha sonora marcante e
envolvente - marca registrada de Xavier Dolan - cria a proeza de nos prender
até o ultimo segundo dos créditos finais, além de ajudar na construção desse
universo psicótico, nutrido pela dor de três pessoas que não sabem como se
libertar do passado e continuar a viver.
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