Interessante
quando você cresce e as coisas passam a ser tão inesperadamente insignificantes
e bobas. Na adolescência - com quinze e dezesseis anos - me
lembro da inocência e curiosidade quando me
deparava com filmes na TV de classificação 18 anos. Eu ainda não estava na minha fase de cinéfila,
isso só foi começar dois anos depois quando enfim alcancei a maioridade e
passei a ver todos os tipos de filmes.
Começo assim, pois vou comentar da série Skins (Canal E4, Reino Unido, 2007-2013),
extinta já há dois anos. Aqui no Brasil, ela era transmitida na falecida MTV,
altas horas da madruga, e com a classificação preta e assustadora dos 18 anos.
Eu mudava o canal (sem nem ao menos ver o conteúdo), com receio de um possível
flagra materno. Agora assistindo a série no Netflix eu digo: quanta
bobagem. Por quer levar o jovem como um tolo, ao "não recomendar" que ele assista coisas
que são do seu próprio cotidiano? Eu não era nenhuma rebelde ou radical na
minha adolescência – sofria de depressão, e não tinha uma vida social aflorada
– mas não era afastada da realidade. Sabia muito bem das drogas no meu ambiente estudantil. Assim como
sexo, distúrbios alimentares, abortos, problemas amorosos e familiares. Ao
assistir Skins, percebo que são sempre os mesmos problemas, a única diferença é
a geográfica, e por consequência trás diferenças culturais. Mas o drama interno é real e o
mesmo.
O elenco das três gerações de Skins (2007-2013) |
Criada por Jamie Brittain e Bryan Elsley, a ideia era de abordar a vida de
um grupo de adolescentes na faixa de 16 a 18 anos. Iniciada em 2007, a primeira geração apresentava os personagens: Tony (Nicholas
Hoult), Sid (Mike Bailey), Jal (Larissa Wilson), Michelle (April Pearson),
Chris (Joe Dempsie), Maxxie (Mitch Hewer), Anwar (Dev Patel), Cassie (Hannah
Murray) e Effy (Kaya Scodelario). A cada duas temporadas (teoricamente quando
os jovens já teriam se formado), o elenco seria renovado, e uma segunda geração
surgiria. O roteiro se forma como uma só história, mas cada episodio teria
como protagonista um dos jovens, sendo uma forma muito boa de introdução e
aprofundamento cinematográfico dos personagens. Embora a primeira, segunda, terceira e a
última temporada (sétima) sejam realmente as melhores, no seu contexto geral,
Skins é bastante produtiva e bem feita.
É interessante
como que Jamie Brittain e Bryan Elsley exploram o fato de que todos os jovens
são problemáticos. Comentando em especial a primeira geração, todos possuem de
alguma forma problemas familiares que os levam a buscar na rua emoções e
atenção que não conseguem dentro de casa. Estranhamente, os dois personagens
principais da primeira e segunda geração, Tony (Nicholas Hoult) e sua irmã mais
nova Effy (Kaya Scodelario), vivem dentro de um núcleo familiar bastante
sólido, com pais “normais” e que se importam com os filhos. Entretanto, os
irmãos são duas personalidades enigmáticas, com um poder de manipulação e
persuasão (muitas vezes levado para o mal) incrível. Eles são a liderança, o polo magnético
que mantém todo o grupo de amigos unidos, mesmo diante dos desvios de caráter de
ambos.
Tony é bonito,
carismático, com uma lábia excepcional. Trata sua namorada Michelle – a
“gostosa” do grupo, que mesmo aparentando segurança, é frágil e indecisa em tudo
na sua vida - como um objeto. Por sua vez, o seu melhor amigo Sid é apaixonado
por Michelle, é tratado como um capacho por Tony, e não consegue perceber como
existem outras garotas na vida, o caso de Cassie – menina anorexia, com
problemas familiares, mas pura e doce – que está apaixonada pelo garoto. Ainda tempos Jal, uma amiga exemplar, que
sofre em casa pela perda da mãe e indiferença do pai. Chris (protagonista em um
dos episódios mais engraçados que eu já vi na minha vida), garoto confuso, com
complexos do seu corpo, mas engraçado e entusiasmado. Temos ainda Maxxie e Anwar, melhores amigos,
mas que tentam conviver com as diferenças entre ambos – o primeiro é gay e o
segundo é muçulmano.
E por fim
tempos a irmã mais nova de Tony, Effy. É visível a fascinação que os produtores/roteiristas tinham pela personagem, e acredito que pela atriz Kaya Scodelario. Inicialmente esta personagem não estava inserida na narrativa na primeira temporada, a introdução veio após Bryan Elsley a conhecer nos dias da audição (onde a atriz foi descartada por sua idade - ela tinha 14 anos, e os elenco precisava ter 16 a 18 anos), ou seja o personagem foi feito especialmente para ela. E por causa dessa fascinação muitos problemas no roteiro surgiram na quarta temporada, mas não tira o brilho da ideia.
Ela que seria a única personagem que permaneceu nas duas gerações, pra mim é o maior enigma da série. Sendo definida como o "autocontrole em pessoa", na primeira temporada nos deparamos com uma personagem muda, que se coloca no silêncio absoluto como forma clara de não aceitar a aproximação das pessoas, de não se envolver emocionalmente. Tanto que o episodio do qual ela é apresentada, sua única fala é que mais revela sua personalidade e o sentimento juvenil revoltante: “As pessoas que eu deveria amar, eu odeio, e as pessoas que eu deveria odiar, eu amo”. Uma forma clara de mostrar as más companhias e as más escolhas que essa personagem iria ter durante a série.
Ela que seria a única personagem que permaneceu nas duas gerações, pra mim é o maior enigma da série. Sendo definida como o "autocontrole em pessoa", na primeira temporada nos deparamos com uma personagem muda, que se coloca no silêncio absoluto como forma clara de não aceitar a aproximação das pessoas, de não se envolver emocionalmente. Tanto que o episodio do qual ela é apresentada, sua única fala é que mais revela sua personalidade e o sentimento juvenil revoltante: “As pessoas que eu deveria amar, eu odeio, e as pessoas que eu deveria odiar, eu amo”. Uma forma clara de mostrar as más companhias e as más escolhas que essa personagem iria ter durante a série.
Episodio "Fire" da sétima temporada |
A segunda
temporada é toda centrada nos reflexos das conclusões tão chocantes que
ocorreram na anterior. O acidente com o personagem Tony mudou radicalmente a
vida de todos os seus amigos. E dessa forma, a série se torna mais profunda e
mais centrada na obrigação da maturidade desses jovens. A família de Tony vira
de cabeça para baixo diante do acontecido, sua irmã descobre que não pode mais
se esconder nas “birras” infantis, e passa a ser a única parte “sã” e que ainda
mantém a família em pé. Ainda temos Michelle e Sid, que agora não sabem o que
fazer diante das mudanças de relacionamento, o que leva a Cassie se adentrar no
terreno da insensibilidade e do prazer a qualquer custo, com um intuito de fugir
da realidade. E por fim, uma morte perturbadora, mas que revela muito o futuro
deles.
Foram sete
temporadas, mas tenho que concordar com o que dizem que a primeira e segunda
foram realmente as cruciais, e a série muito bem poderia ter terminado ali. Mas
claro, que nem tudo é ruim. Na terceira temporada novos personagens são
apresentados, surge um casal lésbico (explorado com um melodrama desnecessário na temporada seguinte), temos um quadrado amoroso juvenil (embora sem muito contexto), além
de comentar sobre um fenômeno muito comum na juventude (eu que o diga!) que é a
depressão. Quanto mais pessoas falarem
sobre isso, mais as pessoas irão perceber a gravidade dessa doença, e de como
ela deve ser tratada.
Entretanto nesta temporada o essencial foi sem dúvida a introdução do personagem Cook (Jack O'Connell). Interpretado muito bem pelo o ator de Invencível (Unbroken, 2014, EUA/UK), o personagem é uma caricatura da libertinagem que existem entre os jovens. O garoto possui uma mescla de insanidade com autodestruição que só é páreo para Effy. A verdade é que esses dois personagens são os mais importantes em termos de coerência e foco no mundo real. Os produtores conseguiram com esses dois elementos, definir e descrever toda a geração Z, com suas implicâncias sociais e culturas diante das mudanças na modernidade. A autodestruição é cultivada por eles de maneira perturbadora, e completamente contextualizada.
Entretanto nesta temporada o essencial foi sem dúvida a introdução do personagem Cook (Jack O'Connell). Interpretado muito bem pelo o ator de Invencível (Unbroken, 2014, EUA/UK), o personagem é uma caricatura da libertinagem que existem entre os jovens. O garoto possui uma mescla de insanidade com autodestruição que só é páreo para Effy. A verdade é que esses dois personagens são os mais importantes em termos de coerência e foco no mundo real. Os produtores conseguiram com esses dois elementos, definir e descrever toda a geração Z, com suas implicâncias sociais e culturas diante das mudanças na modernidade. A autodestruição é cultivada por eles de maneira perturbadora, e completamente contextualizada.
Episodio "Pure" da sétima temporada |
Em 2013 quando
os criadores perceberam que já era hora de encerrar a série (diante da queda de audiência nas quinta e sexta temporada), foi feito uma
temporada diferente. Jamie Brittain e Bryan Elsley escolheram os três
personagens de todas as temporadas que são mais interessantes, com dois episódios
para cada um deles, retratando suas vidas após a adolescência, na faixa de 20 a
25 anos. Nessa temporada, com um roteiro completamente distinto, mas muito bem
escrito e engajado nas histórias que já conhecíamos nas temporadas anteriores.
Effy em “Fire” ela tenta desesperadamente em encontrar um rumo na vida,
enquanto continua a esconder suas emoções. Se envolve com o chefe e passa a ser
peça chave em um jogo de manipulação. Nesse desespero de se encontrar, de
autoafirmação ela brinca com fogo, e é queimada. Cassie em “Pure” é apresentada limpa das
rebeldias da juventude, limpa de distúrbios alimentares, e se torna uma mulher
com a pureza que ela sempre carregou em si. Ela aceita os desafios do futuro com firmeza e esperança. E por fim Cook em “Rise”, tentando
se ascender internamente, em meio às lembranças e consequências do seu passado.
Como dizem, esta temporada não lembrava muito os episódios passados de Skins. Como os roteiristas sempre se mostraram focados na realidade, aqui mais uma vez eles mostram a melancolia dessa geração. O cenário escolhido é a Londres, cidade grande o suficiente para abafar completamente os anseios e angustias desses jovens do interior. Com a fotografia belíssima, e a trilha sonora intensa, tudo remete a melancolia. Seja o olhar perdido de Cassie pela sua janela, Cook andando pela noite escura da cidade ou Effy desvairada na boate (inclusive: cena belíssima esteticamente). Tudo remete a uma angustia do "não se encontrar", do infinito "procurar por algo" que assola toda essa geração de jovens.
Como dizem, esta temporada não lembrava muito os episódios passados de Skins. Como os roteiristas sempre se mostraram focados na realidade, aqui mais uma vez eles mostram a melancolia dessa geração. O cenário escolhido é a Londres, cidade grande o suficiente para abafar completamente os anseios e angustias desses jovens do interior. Com a fotografia belíssima, e a trilha sonora intensa, tudo remete a melancolia. Seja o olhar perdido de Cassie pela sua janela, Cook andando pela noite escura da cidade ou Effy desvairada na boate (inclusive: cena belíssima esteticamente). Tudo remete a uma angustia do "não se encontrar", do infinito "procurar por algo" que assola toda essa geração de jovens.
É fato que o
destino final dos personagens foi bastante perturbador. Mas o que os criadores
da série queriam era mostrar como finais felizes realmente não existem na vida
real. Tudo o que fazemos se reflete no que virá no futuro, e esse foi o futuro
desses jovens de Bristol.
Disponível completa no Netflix.
Download
Nenhum comentário:
Postar um comentário