A relação conflituosa que existe
entre o México e os EUA, tem gerado ao longo do tempo muito material para a
produção de filmes. A violência constante na fronteira devido ao impacto que a
proximidade dos americanos com a situação social e cultural caótica dos
mexicanos, já levou a morte milhões de pessoas e criou uma patologia de “normalidade”
da situação que nos mostra que o problema não será resolvido tão cedo.
Particularmente não sou adepta a
filmes com violência exagerada, como ocorre em filmes de Tarantino. É obvio que os textos do diretor americano são sempre engenhosos
e muito bem escritos, mas pessoalmente não me sinto à vontade em assistir
brutalidades em cenas cômicas. É uma escolha de linguagem do diretor que eu não
aprecio.
Entretanto, quando a dosagem de violência
está em concordância com a narrativa não evito a apreciação, como ocorre com o
diretor canadense Denis Villeneuve. Seus
filmes estão mais para o tom de denúncia do que selvageria gratuita, como
podemos ver em Incêndios (Incendies, Canadá, 2010). Um filme com
um texto extremamente inteligente, narrando os impactos da guerra religiosa na
vida das pessoas da contemporaneidade, mas com um desfecho que prende sua
respiração por um longo tempo. Em Politécnica
(Polytechnique, Canadá, 2009) é
assustador a maneira como Dennis retrata o Absurdo, em uma atmosfera P&B,
fria e sem emoção caracterizando perfeitamente o assunto do filme.
Não fugindo de sua característica
estilística, Dennis aproveitou o conflito da fronteira para mais uma vez fazer
uma crônica dura e tensa da violência com Sicario:
Terra de Ninguém (Sicario, EUA/Canadá,
2015), lançado no Festival de Cannes deste ano, e indicado a Palma de Ouro. A
narrativa ficcional de Dennis concentra na personagem Kate Macer (Emily Blunt), uma agente do FBI que trabalha no combate
ao tráfico de drogas nas cidades americanas de fronteira, que após um incidente
se voluntaria para integrar uma força tarefa do governo, chefiada por Matt Graver (Josh Broslin) e Alejandro (Benicio Tel Toro) para
combater um quartel mexicano.
Os acontecimentos que levaram
Kate a se voluntariar nos mostra o tamanho do seu idealismo como policial, e
como ela acredita na justiça. Entretanto isso não torna a personagem tola ou ingênua
(como foi dito por ai), a torna simplesmente humana. Vejamos, se a justiça ainda
funciona em muitos casos é porque as pessoas ainda não perderam a capacidade de
ter esperança e trabalhar por isso. Kate acreditava em seus superiores e na
integridade dos departamentos de seu governo.
Sicario é todo conduzido por uma câmera
firme, com cenas áreas constantes. Dennis queria evidenciar que a violência na
fronteira é uma guerra, e ao mostra a imensidão da terra, ele nos indica também
o tamanho real do problema. Embora os conflitos do filme sejam passados
essencialmente no território mexicano, o diretor deixa claro que tudo é um
reflexo da proximidade com os EUA e como eles exercem o poder imoderado aos
vizinhos.
As imagens de Juarez (território mexicano)
são uma mostra das ironias que essa zona de conflito vive. O seguimento da
fronteira, é sem dúvida a melhor parte do filme. Assim como Kate, estamos completamente
no escuro, sem saber o que acontecerá. Denis prefere mostrar como as pessoas
estão doentes ao ponto de nenhuma manifestação de horror surgir em meio a
violência gratuita e desrespeitosa. Isso vai em contramão a protagonista, que vê
seu idealismo pouco a pouco ser destruído pela realidade.
O elenco é realmente bem
escolhido. Emily Blunt como a única mulher no elenco masculino conseguiu
segurar o personagem, e conseguiu sintonia com os co-protagonistas. Josh Broslin, está em uma atuação bem
executada. Seu personagem era enigmático e incomodo, da forma que se pretendia
ser. E temos por fim Benicio del Toro - que trabalhou anteriormente com Blunt em O Lobisomem (The Wolfman, Reino Unido/EUA, 2010) - , que conduz o filme totalmente, sendo
peça chave para o entendimento da narrativa. Suas falas são poucas, mas por um
proposito óbvio de mistério.
A cinematografia é uma das
melhores do ano. Detalhe para as cenas com o uso de câmeras noturnas, artificio
que nos introduziu dentro da guerra. E claro, não posso deixar de comentar da
trilha sonora de Jóhann Jóhannsson, simplesmente sensacional. A sintonia da
trilha tensa e digna de filmes de terror não permite descanso ao espectador. Ficamos
desconfortáveis exatamente como a protagonista, e a música é sentido essencial
para que possamos ter o que Kate sente.
Sicario sem dúvida é um filme das
contradições da realidade. Em Juarez no México, uma das cidades mais violentas
do mundo, Dennis Villeneuve mostra uma cidade sobrevivendo em meio ao caos. Ao
mesmo tempo em que ele exibe cenas de pessoas assassinadas e a polícia inserida
nas ruas como mais um adorno da paisagem, temos pais brincando com seus filhos
na rua, ou os levando para o futebol. A cena que finaliza o filme é fantástica,
e indica exatamente essa questão: as pessoas comuns estão fadadas a viver em
meio a essa luta de poder, mas nada muda.
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